sexta-feira, 11 de novembro de 2005

Além

Gosto quando você ri das coisas que digo.
Acredito que no fundo você sabe que esse era o retorno que eu esperava. E ri, assim como quem acha graça, quando na verdade só quer me agradar.
Pouco sabemos um do outro. Mas digo que sei o bastante para comprovar a metafísica.
Muitos poetas confiam no olhar, pois eu arrisco a minha confiabilidade ao que meus olhos não podem ver. Cansei de dar crédito ao físico. Quem disse que o que os olhos não vêem o coração não sente? Penso que o coração não é subordinado a nenhum sentido sequer. Ele é o único que ultrapassa as leis, a razão, o mundo físico. Ele prevê, nos mostra uma verdade que mora além do que os olhos podem ver. Nos mostra o percurso que a nossa visão deve fazer.
Não sei o que você quer de mim. Na verdade não me sinto capaz de servir-te de amparo. Parece que você é meu escudo. Sinto-me frágil quando penso na possibilidade de me colocar às suas costas. Sou pequena ao seu lado, não me vejo à sua frente, e por incrível que pareça: gosto disso. Gosto de buscar em você as palavras que agora me fogem. Seu esforço para que eu encontre é quase que insignificante perto do que posso ver sem que você note. Vou assim, aos poucos me especializando em te descobrir, te estudo e busco no seu desinteresse o que me interessa. Busco nos seus erros os meus acertos.
Tudo isso acontece sem que eu controle, sem que eu me de conta de que essa inocência em relação a você tem feito com que eu encontre as vírgulas que até hoje eu fiz questão de ignorar. O seu jeito de ouvir o que eu digo, de atender aos meus pedidos mais infantis, me fazem perceber o quanto você quer que eu me sinta grande. E é exatamente isso que me faz cada vez menor. Percebo nos gestos mais minuciosos a sua disposição para que eu encontre um anteparo, uma pausa, uma vida como você diz (E eu acho graça. Como sempre). O seu sorriso desconcertado me fez buscar um tempo meu. Enquanto você concerta o seu sorriso, eu admiro sua capacidade de compreensão, que também não é o meu forte.
Agora me deparo com a sua voz, que me soa engraçada. Eu rio. Rio assim como você ri de mim quando já espero. Em meio a tantas vírgulas que você me fez encontrar, a tantas fraquezas que descobri, me pergunto se o meu sorriso igualmente desconcertado te parece um agrado também. Fico na ansiedade, esperando uma resposta que sei que não virá. Fumo um cigarro para não devorar a geladeira. Sei que não gosta, mas faço questão de te contar. Acho que é uma forma de chamar sua atenção, de te manter sempre atento, de ouvir seus conselhos preocupados, de tentar descobrir no seu jeito de falar o que se passa na sua cabeça, de tentar te conhecer a ponto de saber se você imagina que o meu sorriso destemido é mais uma estratégia para controlar o medo que vejo de um dia te sentir pequeno.
O que o coração não sente os olhos não vêem.

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