segunda-feira, 31 de agosto de 2009

No caminho tem uma pedra?

Eu preciso falar sobre uma coisa que me aconteceu hoje. Eu estava andando, indo em direção a Moreira Cezar. Eu estava indo pra terapia. Quando entrei na Mariz e Barros me aconteceu algo inesperado, muito inesperado mesmo. Eu estava indo pra terapia, como já disse, eu dobrei a rua, entrei na Mariz e Barros quando a orelha da minha sandália começou a pender pra um lado, foi no começo da rua que de repente a sandália que mais me cai bem aparece com um defeito. Eu continuei andando indiferente ao caso, mas eu não podia deixar de olhar, eu no fundo acreditava que tudo ia voltar a ser como antes sem que eu precisasse me esforçar. Era assim que deveria ser. Isso não estava acontecendo! Não comigo, não hoje. E eu continuava andando frenética olhando meu pé direito passo sim, passo não. Até que resolvi ceder, ajeitar, porque aquilo estava me incomodando, me distraindo, me irritando. Eu ajeitava sem nenhum critério e com uma vontade de arrancar aquela coisa errada e ir a pé, mas eu ainda me preocupo com o social, felizmente, ou não. Eu dava cerca de 10 passos e a orelha voltava pra onde nunca deveria ter ido. Isso foi me cansando até que eu sentei na calçada enquanto passava um caminhão de lixo, eu acho, e uma mulher, ou um homem com um cachorro, ou um homem sem cachorro, perto do poste cheio de lixo, e eu sentei perto desse poste porque precisava ser naquela hora o acerto com a sandália, ajeite-a com paciência e mais 8 passos ela tornou a sair do lugar. Eu chorei. Afinal de contas era o que me restava. E por fim já estava atrasada pra terapia, tive que andar mais rápido contando com as paradas que a sandália exigia de mim. E eu chorava. Eu gosto muito dela. Muito mesmo. Era triste ver que ela, ela que eu comprei, também estava me decepcionando. Fui chorando, concertando a sandália, chorando, concertando a sandália, as vezes os dois juntos, as vezes nenhum, e a raiva foi crescendo, fiquei com vontade de socar o poste, o lixo, até que cheguei. Cumprimentei mal o porteiro, arrumei a sandália, chorei mais um pouco, ela me mandou que aguardasse no corredor, e eu odeio quando ela faz isso, porque o corredor não tem cadeira, só lá na frente onde ela não pode ver e não vai até lá chamar, então eu sento no chão em frente a porta e hoje na agência de viagens que fica ao lado tinha muita gente, uma família parecia, todo mundo feliz. E eu lá sentada no chão com a mochila entre as pernas lendo, e eles felizes, e eu lendo, e o cara saiu, me cumprimentou, e ela abriu a porta e um menino de óculos saiu. Acho constrangedor esse encontro na porta da terapia, você sabe que a pessoa acabou de falar coisas, sei lá, acho desconfortável, sabe que ela acabou de se expor, saber que ela tem coisas a tratar, saber que é gente. Entrei na sala e comecei a falar de coisas outras, e só muito depois falei da sandália, porque eu precisava de um jeito falar dela, era só o que eu pensava enquanto tudo acontecia, precisava falar e escrever, eu precisava falar do quanto isso me incomodou, do quanto estou, do quanto uma sandália pode alterar o caminho de uma pessoa, do quanto eu precisava estar com aquela sandália, comecei falando de outra coisa que acabou nisso e eu chorei e falei da sandália, e chorei, e falei da sandália. Eu posso dizer que hoje eu chorei por causa da sandália.

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

"O maior preço que se paga pelo amor é ter de ter alguém junto, não se pode ficar sozinho, que é sempre tão melhor"

A.W.

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

vamos fugir?


sobre a distância

a distância aproxima de um jeito bonito e cheio de cor.
a distância aproxima de um jeito bonito e cheio.
a distância aproxima de um jeito bonito.
a distância aproxima de um jeito.
a distância aproxima de um.
a distância aproxima de.
a distância aproxima.
.
.

domingo, 2 de agosto de 2009

Ainda sobre essa coisa de crescer

Dizem que faço filmes sobre homens que se recusam a crescer. Sou um homem de 41 anos que ainda vê as pessoas mais velhas como gente infinitamente mais sabia do que eu. Não sei se sou maduro, mas sei que falar de imaturidade é falar da nossa capacidade de perder e de curar, ou não, a dor da perda. Talvez por isso haja muitos jovens nas minhas historias: a juventude tem na imaturidade sua força de descoberta. Judd Apatow

com tempo e cor

A máquina
da alma
com os anos se trava,
e dizem:
- Ao arquivo!
Acabou-se.
Um de menos!
Maiakóvski

Apareço, prometo.

Ontem eu comprei material escolar. Tinha esquecido o quanto isso me dá prazer, essa coisa de início, caderno em branco, caneta cheia, lápis grande, borracha intacta, apontador virgem, tudo isso. Tudo isso é vida, é verdade e não é feio, ou pouco. Estive pensando, e acho que essa coisa de crescer não é de todo ruim. Não, mentira, não é isso. Pensei algo como "crescer e aparecer" e anotei á noite, ontem também quando estava com um sono que há muito tempo não sinto, acho que por causa daquela taça de vinho que tomei com uns amigos, uma amiga inclusive disse que estava tudo combinando: a taça, meu sobretudo, a cadeira, a mesa redonda e pequena, o bar mexicano, a musica do U2, as fotos na parede de carros, o barulho das pessoas falando cada vez mais alto, o garçom estava sofrendo algum problema afetivo, o outro que sofria algum outro problema que já não sei qual era, percebi que sua voz era baixa e a articulação péssima, sei que ali havia problema de alguma espécie, algo que saiu, virou fala mal dita, sorte dele. Mas ela, a minha amiga, não achava que tudo combinava, não, pelo menos não disse, só falou do vinho, do meu figurino, da meia, do sobretudo e tal, o resto eu que achei agora, aquilo tudo era uma coisa só bem lá no fundo. Mas o assunto não é esse, é outra coisa, essa coisa de crescer. Então, pensei que crescer é ficar abarrotado de certezas e gostos já sacramentados, e essa coisa de sacramento me incomoda, é isso que me incomoda. A gente precisa de muita segurança pra virar alguma coisa de fato, por isso o ensaio constante, ensaiar pra vir a ser um dia, quem sabe. Se bem que pensando agora a gente é como qualquer outra coisa que a gente decide e muda de idéia, não precisa ser pra sempre, deve poder mudar e se não puder também eu invento. Que saco isso também, as coisas todas já prontas, parece que alguém manda e a gente sempre obedecendo, um alguém comum mandando e desmandando sem sequer dar a cara á tapa. Eu só preciso acatar e mudar um pouquinho alguma coisa qualquer pra parecer que a regra é invenção minha. Mas eu sei, agora eu sei, que eu preciso obedecer, porque eu não sei bem, não mesmo, até sei, acho que é pra me enquadrar nisso que chamam de vida, pra viver mesmo, nunca pensei, não mesmo que eu fosse tão amadora nessa coisa de vida, a gente, a gente não, eu preciso aceitar isso, isso e muitas outras coisas, aceitar só, só e só. Eu prometo, prometo não, mas vou tentar. Esse período eu me comprometo a fazer as pazes com a vida, se é que um dia a gente esteve numa boa, mas a culpa não é, nem nunca foi minha, pode ver quanta gente aí também não se dá com ela, acontece que ela é muito difícil, autoritária, não sei, mas fazer o que, eu dependo dela e acho que isso não deve mudar, há que se ter paciência e entender que tem gente que é difícil mesmo.