quarta-feira, 29 de maio de 2013

roteiro do que seria se

e ela chega em casa, ou melhor, ela já estava desde cedo, hoje decidiu-se, quis ficar um tempo olhando pra parede, um tempo jogando conversa fora, um tempo pensando no tipo de vento que ventava lá fora, ela assistia sua única serie, por isso favorita, ela descobriu uma posição incrível pra sua cama, bem ao lado dos livros, não se sente mais sozinha, tem haver com essa tentativa de parar de projetar nos outros o que deveria estar lá dentro, no caso, dentro dela, quando ela vive uma história, de amor, de ódio, qualquer coisa, se afasta dos livros, ela quer dosar, ela quer conseguir se equilibrar numa linha fina e muito frágil, ela quer chegar do outro lado e sabe que só vai ser possível com muito equilíbrio: “estamos num tempo de energias difusas, quem não estiver equilibrado vai se afundar”. não, eu não, definitivamente. “é muito simples, cada um no seu quadrado e pronto”. entendi, se o pensamento fosse esse, nem sexo existiria, ficaria sobrando de uma parte, faltando de outra, nenhuma tentativa alcança.

e ela decidiu mesmo continuar a noite em casa, poderia muitas coisas, poderia mesmo, mas ela quis escrever, ela quis pensar no que ela precisa, ela precisou ir na farmácia comprar a pílula, porque já esqueceu ontem, ela realmente é um fracasso com medidas de prevenção, ela é do tipo que remedia, mas tem coisa que não tem remédio, daí ela tenta se adequar.

seu pai, longe, mas muito longe de ser um modelo de pai vem até o seu quarto, se senta na sua frente, lhe dá o dinheiro dá análise, diz a ela que as coisas estão melhorando, que ele pensa em lhe dar algum dinheiro pra viajar, ela desabafa, fala que se pudesse pegava um avião e desaparecia,  a sensação é de que seus braços se esticam até não poder mais, cada um pra um lado, como num sonho que ela teve a um tempo, mas no sonho quem esticava era sua mãe.

ele diz que quando namoravam não faziam sexo na frente dela, do bebê de 6 meses, ela estranha, nunca falaram de sexo, ela nunca viu sequer um beijo do casal, ele diz que ficavam juntos, a coisa esquentava, ela pedia pra parar, ele dá detalhes, ele diz que nos finais de semana  iam á motéis pra resolver a vida deles, deixavam um tio cuidando, ele fala que é a criação dela, pra ela, segundo ele, tudo isso é muito difícil de entender e aceitar, ele diz que achava um absurdo, a criança estava dormindo, mas ela nunca cedeu. ele diz também que não se pode dar muita importância a brigas, a nada na verdade, daí ele dá o exemplo do irmão que foi demitido pra dizer que as coisas vão se ajeitar, ele, o irmão já está bem empregado, o mercado ta inflado, ele diz, ela pensa que as coisas não tem fluido bem desse jeito com ela. ele diz que eles vão existir sempre, os problemas, mas ele diz que as coisas permanecem, o negócio é não esquentar.

ele virou outra pessoa depois desse problema de saúde, 
dessa crise conjugal 
e da análise
=
coquetel transformation 

ele pulou a poça, essa imagem não sai da cabeça dela, ele estava mal da coluna e de repente um dia, pulou uma super poça, percebeu que estava curado, essa poça fez toda diferença na vida dele.

é preciso pular poças sem pensar em absolutamente nada.

ela pensa que isso explica muita coisa e vai ver um filme ou criar o roteiro de um trabalho de direção que ela assumiu na faculdade, ela está plena apesar de tudo, sabe que isso não deve durar, ela esta pensando em intensificar a análise por algum tempo,

pensa que tudo isso de hoje poderia ter sido diferente se não fosse a análise ontem.

ontem: seu analista atrasa, se explica e isso soa engraçado, essa inversão de papéis, pega o metro no sentido contrário, permanece por cerca de 5 minutos no ponto final, volta pro lugar de onde saiu, a mesma estação, percebe o erro, esta ao telefone com sua mãe, que diz que se sente atropelada, atravessa pro sentido certo, recebe uma ligação que não vê, tenta avisar que está atrasada pra uma reunião por mensagem, mensagem não enviada, pega o livro pra ler, percebe que esta molhado, chega no flamengo, compra um milho macio e branco na saída do metro, sobe pro apartamento, consegue encontrar numa pesquisa sua série favorita e única, assiste um capítulo que já viu, vai pra casa, em casa assiste o capítulo 8, bebe água e dorme consigo mesma.

- mas hoje, o que você fez hoje?














- assisti o capítulo 9 e o início do 10 da minha série favorita e única.



ela lembra que não tem sentido fome há alguns dias, estranhamente, ela não tem sentido fome, alguém disse que ela parece triste, assim, meio sem luz. 

ela pensa que deve ser isso mesmo, ela não sabe quando, mas ela acha que apagou um dia desses pra dormir e esqueceu de acender de volta.

e ela segue sem fome.
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sábado, 4 de maio de 2013

cenário 2013


e agora? Eu me pergunto como tudo vai ser depois de tudo, sim, porque parece que a qualquer momento vai estourar uma bomba, parece um ensaio pro fim, parece que não vai ter fim, parece que vai saltar alguém daquela janela e me dizer pra ficar tranquila, as coisas vão melhorar, sempre melhora, a pessoa vai dizer, eu vou ficar parada olhando, ela vai dizer também que as coisas não precisam ser assim tão duras, a gente pode adestrar o olho, a gente precisa adestrar o olhar pra ver magia, a gente pode caminhar no nosso tempo e chegar também, a gente pode não ter pressa, a gente pode pedir socorro, a gente pode precisar de pessoas, ela vai dizer que eu posso precisar dela, que ela vai estar sempre ali, aqui, em qualquer lugar, ela vai me dar colo, ela vai entender o meu choro, ela não vai me obrigar a encarar um cenário que eu não consigo ver, ela me diz que entende, que sabe que tem gente que não aguenta, não assim, não de repente, ela vai com calma, ela vai dizer que o mundo é cruel sim, que o tempo esta engolindo gente a todo momento, ela vai me pedir pra não perder a magia, ela recupera minha magia, ela vai me lembrar de tudo que eu tenho de bom, vai dizer pra eu trocar de roupa e ir dançar: dança menina! vai, dança! eu vou dizer a ela que eu ando tonta, que eu acho que vou cair, eu vou dizer a ela que nunca tive tanto medo, eu vou pedir pra ela me dar a mão: dança comigo? ela enxuga meu rosto, me dá água com açúcar, me lembra que existe doce, se afasta, vai pra janela e me diz: vai você que eu fico de longe olhando.