Era iverno.
Mariana levantou ao meio-dia, abriu um sorriso de dar inveja ao sol e pensou em como seria bom se cada um ficasse enrolado, mergulhado em si até o momento que julgasse necessário. Ninguém melhor do que nós mesmos para entender as lamúrias da nossa alma. Alguns sábios dizem que "preguiça é revolta", se tivesse nascido em qualquer época turbulenta, seria ela a líder de uma revolução sem causa. A luta pelo nada, como toda e qualquer luta. Ela só queria aconchegar a alma, aquecer suas mãos, para não acabar resfriando. As revoltas são mais valiosas quando se esbraveja consigo. Aquele que grita para uma multidão é porque ainda não se convenceu de fato.
Mariana sabia das suas horas, sabia o exato momento de partir pra si.
Ela tinha graça, era a graça em pessoa e dançava até quando não sabia o passo, dançava sozinha sem atentar para tropeços comuns, como uma folha que sabe, mas não teme o impacto da queda.
Dançava,
dançava,
dançava até suas mãos ficarem frias.
Até que um dia frio-desses-qualquer resolveu experimentar dançar junto. Dançou com um vendedor de sorvetes que parecia ser seu amigo, dançavam horas e horas sem tropeços, com métrica, agora os passos eram precisos. Pensou em como um vendedor de sorvetes conseguia ter mãos tão aquecidas, mas desistiu de entender. Se apegou àquele par a ponto de nem se lembrar da dança consigo, das quedas, do frio nas mãos.
Um-dia-seguinte Mariana foi ao encontro do seu par que não mais estava. Chegou a se perguntar se algum dia esteve, olhou para o chão e viu um sorvete caído com a casca apontando pro céu, ameaçou pegar, mas desistiu de arriscar o calor que ainda conservava nas mãos. Acontece, que o moço não podia mais ficar ali, teve de habitar lugares mais quentes para vender seus sorvetes frios, fora vender sorvetes em outra freguesia.
Mariana sentiu frio nas mãos, resfriou e foi durmir.