domingo, 11 de novembro de 2012

um recurso ou uma tentativa dramaturgica


Eu estava jogando bola como fazia sempre toda quarta com o pessoal lá do trabalho, aquele dia minha perna direita doía um pouco, na altura na coxa, mais aqui perto da virilha, tenho mania de chegar em cima da hora, daí nunca consigo alongar, poderia ser por isso, mas nesse dia não, ela doía porque peguei muito peso no dia anterior ajudando uma amiga na mudança, fui pegar a televisão com um pouco mais de cuidado, ela estava no chão, a perna deu uma balançada, me segurei pra não cair e pra não derrubar a tv, aí deu uma pontada na perna, nessa parte interna aqui, eu estava lento aquele dia, bastante lento jogando na defesa, coisa que nunca faço, já tinha reparado, não era a primeira vez que tinha uma mulher sentada num banco sem encosto de cimento que fica do lado esquerdo da quadra, no caso do meu lado esquerdo naquele dia, ela estava lá sentada como toda quarta, ela chegava sempre com 20 minutos em média de jogo começado e ficava lá, olhando, não parecia conhecer ninguém, ficava lá sentada olhando, ela sempre me incomodava de alguma forma, não sei bem porque, mas ela não conhecia ninguém, o jogo acabava e ela ia embora como se fizesse parte daquilo, sempre usava vestido, isso eu reparei, vestidos meio soltos em geral na altura do joelho, era uma mulher de meia idade, devia ter uns 30 anos, cabelo médio, meio castanho, rosto neutro, assim meio sem graça, perna fina, meio magra pro meu gosto, esse dia ela estava com um vestido meio vermelho de alça, pouco decotado, tinham umas coisas desenhadas, tipo flores eu acho, ela chegou no horário de sempre e sentou, eu tava de longe e procurava não olhar muito, de repente me pareceu que ela fazia alguns movimentos repetitivos com as mãos de cima pra baixo, fiquei olhando aquilo, a bola passou por mim, se não me engano foi gol do time adversário, eu fui chegando perto, parecia que ela tinha uma coisa na perna direita, era um movimento na perna, o vestido era vermelho, de perto eu vi melhor, ela estava repetindo cada vez com mais intensidade, quando pude ver com nitidez, percebi que ela estava com um vestido vermelho, e tinha uma faca na mão também, ela tava esfaqueando sua perna direita cada vez com mais intensidade, sua mão subia e descia, era esse o movimento que eu via de longe, ela fazia com prazer, quase sem dó, tinha sangue em volta e ela estava com sapatos brancos lindos, eu parei na frente, olhei pros sapatos e perguntei:

- Porque você ta fazendo isso? Quem é você?
- O que você tem com isso? Me deixa.
- Sai daí! Quem é você?
- Ela é meu cavalo, eu gosto de torturar ela, eu preciso fazer isso.

Eu mandei aquela coisa embora, gritei alto mandando a coisas sair, ela desmaiou, ajeitei o vestido, limpei os sapatos com a minha camisa, coloquei a faca no banco, peguei na sua mão, coloquei ela nos braços, minha perna reclamou e andei em direção ao carro. 

grande ideia para algo cênico

Tinha
uma menina
 que só sabia
 fazer coisas pequenas.





paint paint paint


Eu queria falar um pouco sobre essa espera.
A gente não sabe de onde vem, a gente queria que já chegasse, a gente queria nunca ter tido pra não ter que aguardar o retorno, eu agora vivo o caos de não saber sair daquilo, de continuar presa de um jeito abstrato e cheio de cerejas em volta, tem muita coisa que olha pra gente, e ás vezes isso que olha dói, ás vezes não dói, mas sempre muda alguma coisa, há que se ter cuidado, há que se cuidar, há que cuidar menos dos olhares outros e focar no seu. 
Você olha pra que? 
Por que? 
Pra dentro? 
Dentro tá onde? 
Você sabe ainda? 
Ainda dá pra achar você nessas escadas e areias todas? 
Muito degrau, muita cor, muito preto, pouco branco. Isso tudo vira algo, e têm aquele posto, tem aquela rua, aquele túnel, tem as crianças que morreram na escola, as chuvas de verão em maio, têm tudo isso e ele ali parado, correndo da cor, correndo de tudo que faz rir e faz sangrar também. 
Mas que sangue é esse que de tão azul e precioso não deve escorrer sob nenhuma condição, sob nenhum outro sangue azul claro?
Acabo de ouvir:  há um caminho muito duro a percorrer, muito duro e difícil, então espere.
Deve sentar?
E todas essas questões de pele que surgem com esse aguardo todo? 
E o intestino que cada dia vai piorando? 
E o corpo que envelhece?
Ana disse que agora tudo seria dito, seria claro, seria, seria, seria, mas como? 
Que mundo é esse que usa o facebook pra manter relações? 
Que relações são essas que nunca existiram?  
Pode ser que jogar gelo no vinho seja a coisa mais autêntica já feita, e tem essa coisa também de chegar em casa e ligar a TV, você liga pra desligar você. Eu não sei não, mas tem algo que não acontece nesse tempo. 
Ou será que sempre foi assim? 
Pode ser?
Existem mais coisas que acontecem ou não?
E quando a gente desiste de esperar o que  acontece?
O que vêm depois da espera?
Me espera na ativa?
Quantas pessoas esperam pela gente?

Você tem q aceitar
 e uma forma de aceitar é também intervir na mudança.

tempo tempo tempo


e quando a coisa é do jeito que foi você pode saber que ela tava no limite entre o que poderia ter sido ou não.
o limite é o que foi
é quando
e que venha o próximo
limite, claro


.uma espécie de homenagem, pra você, que tem me doído mais do que eu achei que.