terça-feira, 29 de maio de 2012

ele aprisiona, eu liberto

INHOTIK 034

e eu tenho realmente pensado nessa coisa toda de amor, de amar, de deixar alguém te amar, e tudo me parece simples, eu tava, por exemplo, pensando nisso enchendo a garrafa d’água que de repente transbordou, aí tudo ficou claro, a vida sabe é assim cheia de coisa no meio de outras coisas, quando a gente gosta de, a gente gosta e faz valer a pena, o tempo passa, algumas coisas vêm pra fragilizar e você decide sobre a permanecia ou a novidade, tem o fluxo também, cada um tem o seu, mas quando você decide por alguém, sim porque você decide mesmo, e isso é assustadoramente lindo, mas quando vêm esse outro você precisa repaginar seu fluxo viciado, e daí pode ser que sem querer no meio de tudo você comece a reconsiderar a possibilidade de mudar de fluxo, como se aquela combinação já tivesse transbordado, acontece que existe essa variável cheia de si chamada tempo, o tempo tudo, pode destruir, masagoraeumeentendocomele, acredito tanto na construção, ás vezes me perco de tanto acreditar, dá medo, porque fica cada vez mais comum o oposto, sempre tive mania de pensar mais na frente, isso me ajudou a existir, porque no fundo só se trata disso de aprender a existir sozinho, é que dói tanto quando esse existir depende de outro existir, dói porque ás vezes as pessoas querem existir juntas de maneiras diferentes, e eu realmente tenho me deixado, me deixado tanta coisa, só que se abre mão de um apoio e surge outro, essa coisa de conseguir existir junto por exemplo, isso requer maturidade, e isso eu sempre tive de sobra, fiquei pensando que ele tem medo que alguém o veja envelhecer, por isso não pára, não corre o risco de, e achei que isso explica tanta coisa, explica a dificuldade com o que não é tão cheio de vida, explica a numerologia: quatro = diversão, explica a briga com o tempo, explica a escolha dele por mim, eu não sou do tipo que abandono, sou do tipo que continuo, que passo por cima, não sei como é tanto tempo passado, e eu só pensei nisso porque terminei de jantar a pouco, coloquei a bandeja do lado, olhei pro teto de ropão mesmo, pensei no amanhã, como de costume, lembrei que é dia de graça, dia da Graça, e me pareceu que foi ontem que ela esteve aqui, me pareceu que foi ontem que eu disse a ela: é tão bom quando você tá aqui, me sinto muito sozinha; ela disse que as coisas são assim porque eu quero, ela tem razão, mais uma escolha, mais uma vez eu insisto porque acredito, mas ela não entende porque ela precisa diferente, ela me emociona quase sempre com suas histórias, ela fala sem parar, ela cuida da família, cuida da igreja, cuida de mim, dos meus cachorros, eu não sei mesmo se alguém cuida dela, mas ela é linda, ela faz bem pro mundo, tem inocência, tem tanta coisa que a gente não vê mais, lembrei dela, lembrei que ela ligou, eu não pude atender, ela vêm, e as terças me parecem mais compostas, daí eu pensei mesmo nessa coisa do tempo, nessa velocidade, medo, medo de tudo que ta passando, medo do que fica, medo do que pode ser que vá embora em breve, medo desse poder todo, mas também deu uma leveza porque se perceber dentro olhando de fora é algo parecido com viver, pode ser que seja isso, pode ser que ter percebido ele nesse contexto tenha humanizado a figura, todo mundo é tão pouca coisa, e tem o fluxo, tem o diretor que reconheceu meu caderno da papelaria palermo da argentina, não sei nada sobre amor, mas sei que amo quem sabe sobre detalhes, o diretor soube, ele não sabe, porque não tem tempo, ele foge dele, foge do vazio, do silencio, de tudo que possa lembrar o fim, eu tenho pânico de fim, de despedida, eu queria mesmo tudo pra sempre de algum jeito, mas ninguém pode com tanta eternidade, agora com menos gente querendo talvez ela possa comigo, eu posso, eu gosto tanto, eu não sou mesmo desse tempo, não sou do tempo das coisas que passam, das coisas que se sobrepõe, eu não consigo com o que passa, mas eu deixo passar, é que pra mim fica, não conto pra ninguém, guardo segredo, mas eu finjo, finjo que deixei passar e guardo aqui dentro porque acho que um dia a coisa pode voltar a existir se couber, quase como se pudesse fazer uma colagem de vida, tipo quando fui na casa daquele cara que se dizia apaixonado sete anos atrás, ele tava aqui esse tempo todo, assim guardado, é que tem muito espaço, me doeu não poder ser o que ele precisava, depois de todo esse tempo apareci na portaria de madrugada e deixei um bilhete pedindo que me ligasse, ligou, nos encontramos, pedi desculpa, ele? blasê, disse que não se lembrava mais, foi ridículo, mas eu não entendo, não entendo como faz pra passar assim, me sinto realmente fora de contexto, falta gente pra sempre, eu pedi desculpa por ter pedido desculpa, nos despedimos e nunca mais nos vimos, no fundo eu queria dizer pra ele que eu não merecia aquilo tudo, me contaram que ele socou a parede na minha formatura, me viu com outro, disse que me amava, isso doeu mais do que qualquer coisa, ele não deveria ter me poupado, eu queria saber das coisas, da força das coisas, ele sentia demais sozinho, não era pra sempre, não era pra dois, no fundo eu queria dizer a ele que eu sinto muito pela parede, ela não merecia aquilo tudo, é difícil dizer pro outro, se diz muita coisa quando se sente, mas se esquece de ser pra sempre, não sei se precisa nem como faz, sei que sinto e preciso,

o amor é egoísta e foi depois de ver a garrafa transbordando que eu me descobri semelhante e entendi tudo.

segunda-feira, 14 de maio de 2012

Febre

Passa 4 Mamis 022

 

Eu ando cansada de não poder precisar, to engasgada com essa idéia de que você, eu não sei. Nossa hoje eu já tomei mais de 5 remédios pra várias coisas, a pílula, aquele remédio pra quando a gente ta com fungo ou cândida, que faz xixi ardendo, tomei uma neusa, e naldecon noite. Eu não sei, acho que eu to com febre, vê aqui pra mim. Eu preciso sempre, eu sou urgente, to sempre em cima da hora ,to sempre sem ar, to sempre dizendo qualquer coisa que não faz sentido. Tem uma coisa sobre precisar que eu fico pensando, eu penso que sempre que você começa a precisar de alguém essa pessoa tira férias e vai pro Canadá, nenhum problema com o Canadá, nem com as férias, acho que o problema sou eu, mania essa de precisar atravessar a rua de mãos dadas, e quando não tem mão você faz o que? Você sabe que uma vez eu peguei a mão de um desconhecido. Eu não sei, acho que eu to com febre, vê aqui pra mim. Então eu peguei a mão de um desconhecido sem querer na rua e só percebi no meio da rua, fiquei meio sem graça, ele também, era um homem mais velho nada interessante, daí eu fui soltando devagarzinho pra dar tempo de terminar a rua. Eu acho que aquilo foi um encontro, ele entendeu que eu precisava dele e me recebeu, sim, porque se trata de receber, porque aqui tudo está sempre transbordando e eu queria mesmo não precisar de análise, você acha que eu gosto de precisar? Não queria precisar escrever sobre mim, você acha que eu gosto de precisar? não queria precisar de ninguém pra continuar... o que? Sabe, uma coisa que sempre me acontece é um amigo me liga quase sempre pra sair, eu nunca posso, quando eu finalmente eu posso, eu ligo, ele não atende, tem também aquele cara que sempre foi apaixonado por você, quando você decide por ele, ele já ta longe. Já aconteceu isso com você? Ai não sei eu acho que eu to com febre, vê aqui pra mim. Eu sei lá, eu nem sei se a gente devia falar disso nessa peça, na verdade eu não sei nem do que essa peça fala. Não gente, desculpa, mas eu não sei nem sobre as coisas que eu falo. Não, assim, eu to na peça, mas eu não, não, não, ai.

Não sei acho que eu to com febre, vê aqui pra mim por favor.